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Dicas de escrita: criando personagens - antagonistas e vilões

20:17neo


Assim como a maior parte dos personagens de uma história, o vilão ou o antagonista é extremamente importante para a construção do livro e do plot como um todo. Raras são as histórias que não precisam do famoso “cara mau” para se desenvolverem e conquistarem o leitor. Um vilão ou antagonista mal caracterizado pode tirar – e tirar muito – a qualidade de um livro, e um bem construído, obviamente, tem a capacidade de tornar qualquer história uma leitura inesquecível. Mas qual, exatamente, é a diferença entre um vilão e um antagonista?

Sabe quando você lê uma história e ao invés de cair de amores pelo protagonista acaba se apaixonando pelo “cara mau” e se identificando mais com ele? Ou quando esse tal “cara mau” é tão mau, mas tão mau que você não pode evitar sentir uma espécie de fascínio por ele, embora não goste de sua personalidade e nem o perdoe pelos seus atos maléficos? Se você respondeu sim para essas duas perguntas, já encontrou pelo menos um antagonista e um vilão, respectivamente, em livros que você já leu.

O antagonista não é mau por natureza. Ele tem seus medos, seus sonhos, seus entes queridos e até mesmo seus atos bondosos, e é justamente por isso que o leitor é capaz de se identificar mais com ele. O antagonista é uma pessoa normal que acabou do lado do mal da história, mas não é nem de longe aquela criatura maléfica e sem coração que vemos tantas vezes em histórias por aí e que já está tão enraizada em nossa mente como a única forma do “cara mau” ser. Seu antagonista pode até mesmo pensar que é o herói e que está fazendo algo bom, por exemplo, mesmo que coisas ruins tenham que acontecer para se alcançar esse bom objetivo.

Já o vilão é mau por ser mau mesmo. O vilão sabe que seus atos são errados e ele não se importa com isso; sua única preocupação é alcançar seus objetivos custe o que custar. Ele também possui seus medos e provavelmente seus sonhos (em alguns casos até seus entes queridos, embora seja raro), mas seus defeitos são tão marcantes que o leitor se sente incapaz de simpatizar com ele.

Ou, para resumir, antagonistas cometem atos ruins, vilões são ruins. Percebe a diferença?

Usando O Senhor dos Anéis como exemplo, temos Gollum, Sauron e o Um Anel como os “caras maus”: Gollum é um antagonista; apesar de cometer atos ruins – como assassinar Déagol para roubar o Um Anel e trair Frodo e Sam –, ele não é necessariamente mau. Muitas vezes nos encontramos até sentindo pena dele, já que reconhecemos que o Um Anel o transformou no que ele é durante a série; em alguns momentos até temos vislumbres do velho Sméagol, que não é, nem de longe, verdadeiramente maléfico. Sim, podemos desprezá-lo e achá-lo fraco, e isso é normal. Nem todo antagonista é criado para despertar o amor do público.

Já Sauron é um caso completamente diferente. Sauron era um dos “deuses” menores de Arda, o mundo de O Senhor dos Anéis, que foi corrompido por Melkor – ou Morgoth – um dos “deuses” maiores, simplesmente por desejar ter mais poder e por querer controlar os demais seres viventes. Sauron é um vilão por ter deixado para trás seu povo e seu mestre para satisfazer suas próprias ambições, agindo sem se importar com quem pode sair prejudicado. Ele não comete atos ruins somente; Sauron é pura e verdadeiramente mau.

O Um Anel consegue ser diferente tanto de Sauron quanto de Gollum. Enquanto Gollum é um antagonista ativo, o Um Anel é um antagonista passivo; o que isso significa na prática veremos em breve.
  • Antagonistas

Como eu disse ali em cima, antagonistas são pessoas normais e não seres completamente maléficos. Eles podem cometer atos maldosos e possuir defeitos realmente ruins, mas não são maus apenas pelo prazer de ser mau; o antagonista vê seu próprio objetivo como algo certo, algo que mesmo causando sofrimento a várias pessoas vale a pena ser alcançado. São eles que, geralmente, conquistam a simpatia e o amor dos leitores, ao contrário do vilão, que no máximo causa fascínio e se torna o personagem que todos amam odiar.

Porém, nem todos os antagonistas são desse jeito.

Como assim?

Para simplificar, existem basicamente dois tipos de antagonistas: os passivos e os ativos. Os ativos são esses que possuem as características que dei até agora como sendo dos antagonistas no geral, e os passivos... Bem, eles não agem de propósito para se colocar contra o protagonista. Vejamos a definição de antagonista no dicionário:
Antagonista
an.ta.go.nis.ta
Que é oposto ou contrário a alguém ou alguma coisa. Pessoa que é contra alguém ou alguma coisa; adversário.
Como podem ver, essa definição traz novamente a ideia de que o antagonista não é mau e sim somente um adversário. Alguns, como Gollum, são ativos; saem do seu caminho para agirem contra o protagonista e assim atingir seus objetivos. Outros, como o Um Anel, são passivos; eles são opostos ao personagem principal somente por serem do jeito que são, e não por agirem desse ou daquele jeito. O Um Anel, por exemplo, não tenta consumir Frodo para impedi-lo de alcançar seu objetivo – jogar o dito cujo na Montanha da Perdição e, portanto, destruí-lo –, mas sim porque é de sua natureza tentar consumir qualquer pessoa que o possua que não seja seu mestre verdadeiro, Sauron. Ou seja, o Um Anel não é mau; ele apenas se opõe a quem quer que o use, coisa que, sim, em boa parte das vezes acaba desencadeando algo ruim. Mas o mau de verdade é Sauron – um vilão.

Simpatizar com um antagonista passivo se torna algo bem difícil na maior parte das vezes e por isso alguns até acreditam que o antagonista passivo esteja entre o antagonista de verdade – no caso, o ativo – e o vilão, não sendo nem amado e nem odiado. Ele está ali apenas, cumprindo seu papel na história, sem ser especialmente maléfico, mas ainda assim atrapalhando os planos do protagonista.

Como escrever um bom antagonista?

Antes de qualquer coisa, antagonistas são personagem normais e devem ser tratados como tal. Por isso, é uma boa dar uma lida na matéria sobre como criar personagens antes de prosseguir com essa matéria.

A regra de ouro dos antagonistas – dos ativos, ao menos – é simples: eles devem ser capazes de ser compreendidos. Seu leitor pode condenar e desaprovar suas ações, mas lá no fundo deve ser capaz de entender o que o levou a fazer tal coisa, mesmo que não concorde. Isso é essencial para despertar a tal de simpatia, e não é algo que você, autor, pode deixar de lado. Abaixo estão mais algumas dicas para se escrever um bom antagonista:
  • Não transforme seu antagonista em um plot device. Sabe aqueles personagens que só aparecem para cumprir um papel e depois somem ou não recebem mais atenção? Então, esse é um personagem sendo usado como plot device; eles não possuem vozes próprias e se resumem a algo que você como escritor pode usar para fazer o plot se desenvolver. Embora em alguns casos isso seja perdoado, nunca, jamais, em hipótese alguma, faça de seu antagonista um plot device.
  • Mostre os defeitos de seu antagonista, mas mostre também suas qualidades. Isso torna o surgimento da simpatia algo mais fácil de se acontecer e o diferencia do típico vilão maléfico incapaz de fazer coisas boas.
  • Faça com que alguns desses defeitos sejam “conectáveis”. Todos nós temos defeitos, não é mesmo? É justamente por isso que conseguimos nos conectar com um personagem não apenas por suas qualidades, mas também por suas falhas; conseguimos enxergar traços semelhantes em nossa própria personalidade e, com isso, compreender o personagem melhor. Não cometa o erro de pensar que o leitor se identifica apenas com as qualidades de um personagem; os defeitos também são muito importantes.
  • Dê um objetivo sólido ao seu antagonista. Esqueça a ideia de dominar o mundo apenas por dominar o mundo. Esse é um objetivo – e uma justificativa – característica de alguns vilões e não de um antagonista. Dê um objetivo mais específico, algo mais pessoal. Lembre-se de que, ao contrário de um vilão típico, seu antagonista agirá não só com lógica (mesmo que uma deturpada), mas também com emoção. Ele sente tanto quanto seu protagonista, e merece uma atenção tão especial quanto a do mocinho da história.
  • E, com o objetivo, dê ao seu antagonista também um motivo e um passado. Por que seu antagonista quer fazer o que está fazendo contra seu protagonista? O que o levou a isso? Em que seu passado, incluindo as pessoas com quem conviveu, influenciou na tomada dessa decisão? Vingança, ódio, medo… Procure algo que consiga ser o suficiente forte para impulsionar seu antagonista, afinal, ele é o protagonista de sua própria história. Tome cuidado, no entanto, com o já citado passado. Tentar justificar tudo o que seu antagonista faz baseado em coisas horríveis que aconteceram com ele torna sua história forçada. Lembre-se que vontade também existe, e que seu antagonista poderia ter se tornado uma pessoa boa mesmo tendo um passado terrível (é aqui que a matéria sobre criação de personagens se encaixa).
  • Seu antagonista também deve ter algumas dúvidas. Não muitas, na minha opinião, mas uma ou outra o fazem parecer mais humano. Muitos antagonistas sabem que o que fazem é errado, mas se apegam àquela frase que diz que os fins justificam os meios, mesmo que esses fins signifiquem assassinar uma família ou exterminar um povo. Ainda assim, de vez em quando, eles podem se pegar perguntando se realmente vale a pena ou se é um modo certo de se conseguir o que quer.
  • Seu antagonista também gosta e odeia coisas normais. Talvez ele abomine salada e adore ter uma biblioteca toda à sua disposição. Seus leitores com certeza conseguem se identificar um pouco com alguém assim. Ele parece uma pessoa normal. Ele é uma pessoa normal. E pessoas normais também possuem paixões e coisas que a assustam, livros que idolatram e séries de TV que lhe parecem a pior ideia já filmada. Não faça de seu antagonista um ser completamente fora da terra ou ninguém conseguirá sentir nada por ele.

Finalizando, seu antagonista deve sim ser capaz de despertar simpatia no leitor, mas ele ainda é um antagonista. Ele ainda comete atos ruins e ainda está no caminho do seu protagonista; se identificar tanto a ponto de se importar mais com ele pode indicar que você está contando a história da pessoa errada. Seu antagonista pode muito bem se tornar o anti-herói protagonista da história que você quer contar.
  •  Vilões

Como já foi dito, os vilões se diferem dos antagonistas por serem ruins como pessoas, e não somente por estarem do lado errado da história. Vilões são mesquinhos, vaidosos, gananciosos, egoístas e manipuladores, o que não impede de outros personagens (como o já citado antagonista) de o serem também.

Como escrever um bom vilão?
Vilão
vi.lão
Descortês, grosseiro malcriado. Abjeto, baixo, desprezível. Pessoa vil, desprezível, que comete ações más ou baixas. Avarento, sórdido.
Como dá para ver pela definição, a regra de ouro é simples: vilões devem ser temidos e/ou odiados.
  • E para isso, ele tem que ser esperto. Ninguém leva a sério um vilão que só comete erros e tem a inteligência de uma porta. Isso, aliás, pode até mesmo fazer seu protagonista perder um pouco do respeito do seu leitor; afinal, com um vilão obtuso e lerdo, qualquer um poderia ser o herói, então seu protagonista não se destaca em nada.
  • Ele tem que ter um motivo. Sim, até mesmo os vilões possuem suas razões, mesmo sabendo que o que fazem é errado (ou não). Ao contrário dos antagonistas, essas razões, na maior parte das vezes, dizem respeito ao próprio interesse do vilão; a mais comum, por exemplo, é a vontade de possuir mais poder, ou seja, a ganância. Vingança também é um motivo comum para vilões.
  • E, para fazer o leitor compreender esse motivo, é preciso entrar na mente do seu vilão. Mostre a quem está lendo como ele vê as pessoas à sua volta e como sua mente funciona. Faça-o parecer real, uma pessoa que poderia muito bem viver entre nós, ao dar-lhe um passado bem construído. Faça o leitor conhecer a lógica por trás dos atos do seu vilão.
  • Seu vilão tem que agir. Seu protagonista pinta o sete, salva o mundo três vezes e o causador do problema só fica sentado em seu covil remoendo seus planos infalíveis. Não dá, né? Seu leitor tem que ver seu vilão tentando acabar com as esperanças do protagonista para acreditar que ele é uma ameaça real e que pode sim estragar tudo. Deixar seu vilão na inércia nunca dá certo.
  • Seu vilão tem que possuir comparsas/servos. Não, eles não precisam venerar seu vilão; na verdade, sequer precisam saber que são usados. Um vilão esperto é um vilão manipulador, e que impõe respeito aos seus subordinados.
  • Mesmo sabendo que faz coisas erradas, seu vilão pensa que está acima do certo e do errado. Talvez por se achar muito mais inteligente do que a maioria, um ser superior, por exemplo, ou por qualquer outra razão que você encontrar. Às vezes, porém, o vilão pode achar que tudo o que ele faz está certo, como boa parte dos antagonistas. Isso simplesmente significa que ele é tão mau que sua própria lógica já se tornou deturpada; é o caso de Voldemort, o vilão de Harry Potter.
  • Faça seu vilão ter chance de ganhar. Todos nós sabemos que a chance de seu protagonista vencer no final é de 99,9%, então o que queremos é saber o que custará a ele essa vitória ou como quantas vezes ela esteve tão perto de não existir. Um vilão que nunca teve uma chance real de ganhar é um vilão incompetente, e um vilão incompetente pode fazer sua história ficar chata.

Para resumir, seu vilão é o personagem que você ama odiar. É aquele que faz seu leitor pensar coisas como espero que esse filho da mãe arda no mármore quente do inferno, mas que é tão fascinante que não se pode não se falar sobre ele. Para isso você também pode usar diálogos, manias e, é claro, a primeira aparição do seu vilão, que, se todos souberem quem ele é, obviamente, deve ser memorável.

Bem, é isso. Espero que tenha ajudado e qualquer coisa é só deixar um comentário.

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